Colunistas VDS: Golfinho explorador em Tapes.

 

Golfinho explorador em Tapes
Aparição a 120 milhas do Atlântico

 

Danilo Chagas Ribeiro
19 Jan 2009

Navegadores contam histórias. Falam do que veem e do que acreditam. Alguns contam que naufragaram no mar e que nunca vão saber o que abalroaram. Outros relatam que sofreram fraturas a bordo ao abalroarem uma baleia dormindo.
Odisseu pediu para ser amarrado ao mastro para escapar do encanto das sereias. Pois bem, nós vimos um golfinho na Enseada de Tapes, Lagoa dos Patos, a 120 milhas náuticas da Barra de Rio Grande, por onde o valente explorador marinho deixou o Atlântico e entrou na lagoa.
Na manhã de 14 de janeiro de 2009, o Comandante Paulo Fagundes da Silveira, a bordo do Riacho Doce, avistou um golfinho nadando na Enseada de Tapes. O veleiro estava fundeado no Capão da Lancha, bem próximo da praia, no Pontal de Santo Antônio. Ficamos observando até que o golfinho apareceu novamente e por ali ficou, pra lá e pra cá.

Naquele momento, o Comandante Emilio Oppitz, que há vários anos navega em Tapes, estava a bordo de um veleiro fundeado no Saco do Céu, no Rio de Janeiro. Liguei para ele logo depois que vimos o golfinho. - Emilio, tu já viu golfinho na Enseada de Tapes? - Mas a essa hora da manhã vocês já tão bebendo???!!! - Ou é ressaca de ontem?... A reação bem-humorada confirmava a raridade do que víamos. O golfinho nadava longe do Riacho Doce, e cada vez que vinha à superfície para respirar, aparecia em um lugar diferente. Não daria para esperar por ele com o zoom da câmera puxado porque seria muito difícil enquadrá-lo.


Cangurus no Pontal de Santo Antônio

Mais tarde perguntei na secretaria do Clube Náutico Tapense se sabiam de golfinhos na Enseada de Tapes. A resposta foi danada:- Tempo desses uns caras disseram que viram cangurus no Pontal de Santo Antônio. Agora vocês viram um golfinho na enseada. Hahahahaha. Eles ficaram 2 dias tentando reencontrar o canguru para bater uma foto, mas não conseguiram. Pior: outro cara disse que viu o tal canguru no Pontal também, pouco tempo depois, sem saber que alguém já tinha visto antes. O Comandante Nelson Fontoura, biólogo doutorado, professor da PUC-RS, comentou que um Tamanduá Mirim pode ser confundido com um canguru, quando sentado sobre o rabo.

 

 

Golfinhos em Tapes - bis.

Dois dias depois de vermos o golfinho, o Comandante Miguel Sanchis soube que pescadores da região viram 3 golfinhos junto ao farolete verde do canalete do Clube Náutico Tapense. Bem, então agora já estamos empatados com o caso do canguru: mais alguém viu o golfinho, além de nós.

 

 


Golfinhos no Rio Gravataí.

O comandante Rui Ketzer relatou ao Grupo POPACOMBR que há uns 40 anos viu golfinhos encalhados no Rio Gravataí, um afluente do Guaíba. Ricardo Habiaga, Comandante do veleiro Atalaia, informou também ao [POPACOMBR] que "é bom lembrar que nesta época do ano, a água salgada entra na Lagoa levando junto camarõezinhos, lulinhas e outras iguarias, com certeza que o boto vai atrás".
E para coroar a documentação da rara aparição dos golfinhos em Tapes, o Comandante Cristianini Evaristo B. de Souza fez essa bela foto aí acima, na Enseada de Tapes, em 18 de janeiro de 2009. Quando vimos o golfinho, ele não estava assim inspirado, saltando.

Palavra da especialist. A bióloga Márcia Bozzetti Moreira, estudiosa de golfinhos, ficou espantada com a aparição:- Nossa! Isto é muito incrível mesmo Danilo! Márcia fez um belo estudo sobre golfinhos. Segue mensagem da bióloga com informações muito interessantes ao grupo.

 

[POPACOMBR] sobre a aparição do golfinho em Tapes:

Sou bióloga e pesquiso mamíferos marinhos há mais de 15 anos...vou tentar explicar algumas questões que apareceram nos últimos e-mails...primeiro: o Dieter está correto, boto e golfinho são a mesma coisa. Estas denominações são o que a ciência chama de "nomes vulgares" ou "nomes comuns", os quais são regionais, definidos pelas comunidades costeiras ou ribeirinhas que convivem com os animais. Em geral no Brasil, se usa o nome boto para os cetáceos (grupo das baleias e golfinhos) que vivem tanto no mar quanto em água doce (estuários) ou aqueles que vivem apenas em água doce (como o boto cor-de-rosa).


Neste caso do Danilo, fui eu que sugeri para ele que deveria ser um boto, pois a espécie mais provável que ele tenha visto é o Tursiops truncatus, aquela espécie que vive na Lagoa dos Patos perto da barra, entre São José do Norte e Rio Grande (e também entra nas barras da Lagoa Tramandaí, entre Tramandaí e Imbé, do Mampituba, em Torres, do rio Araranguá e barra de Laguna, em SC...), que, nada mais nada menos, é o golfinho Flipper, aquele dos seriados de TV.


É um animal enorme, que aqui no sul atinge 3,70m, e que tem autonomia de viajar tudo isto na Lagoa até Tapes, e sobreviver em águas bem poluídas ou turvas (nenhum empecilho...ele utiliza muito mais o sistema de ecolocalização que possui do que a visão...)...o máximo que pode acontecer é pegar uma pereba (geralmente animais que vivem em ambientes muito poluídos acabam tendo doenças de pele, causadas por fungos, pois ficam com a imunidade muito baixa...).


É comum encontrar animais desta espécie com doenças de pele em Tramandaí, Torres e em SC. E como alguém disse, ele vai onde tiver comida! Sei lá o que pode ter feito ele subir tanto, mas pode ter vindo atrás de algum cardume, ou ficou doente, se isolou do grupo e se perdeu...muitas hipóteses e pouca certeza...
Se alguém ver novamente, peço que tente tirar uma foto, para eu poder identificar a espécie com certeza, e para meu trabalho é importante saber se estes animais estão começando a se deslocar tanto assim para o norte da Lagoa.


Sou amiga dos pesquisadores da FURG, vou inclusive repassar o e-mail do Danilo para eles saberem...se conseguirem fotos bem focadas em zoom da nadadeira dorsal, aquela quilha que fica fora d'água quando ele nada, por favor, me encaminhem! Pode ser a chance de se identificar o animal, pois o pessoal de Rio Grande tem um catálogo enorme de foto-identificação dos botos da Lagoa, e muitas pessoas fazendo pesquisas de pós-graduação lá com eles!


Quanto aos lobos marinhos, existem duas espécies principais que ocorrem em Rio Grande, além de outras um pouco mais ocasionais...mas das duas espécies, uma a gente chama de lobo-marinho, que é pequeno, em torno de 2m no máximo...e a outra são os leões-marinhos, bem maiores, chegando a mais de 3,5m...em geral, os animais dos molhes de Rio Grande e SJNorte são estes, e realmente, todos eles tem uma cara de cachorro, com um focinhão e bigodes...Espero que possa ter ajudado em algumas dúvidas... E que todos possam ter experiências como esta do Danilo, pois é realmente uma delícia ver golfinhos, botos ou qualquer espécie animal passeando por perto da embarcação! Abraços, Márcia