Um solinista na Regata Volta a Ilha de Santa Catarina

 

Por Ricardo Machion*

A experiência de velejar na regata Volta à Ilha de Santa Catarina era uma busca que há muito tempo vivia dentro de mim. Já havia velejado em algumas raias, navegado alguns percursos, mas contornar a ilha era um desafio que me atraia uma vez que boa parte das minhas experiências foi vivida em águas abrigadas.
Foi através de um convite que surgiu essa oportunidade, mas não um convite para mim. O comandante do barco estava buscando formar uma tripulação para correr a regata e um grande amigo e velejador, por ter um compromisso na mesma data me indicou para o barco.
Aceitei imediatamente o convite, entrei em contato com o comandante e marcamos o encontro na sexta feira que antecedia a regata.
Na sexta, próximo à hora do almoço encontrei outro tripulante do barco que me apresentaria à embarcação e juntos faríamos o check list que nos foi passado anteriormente.
No final da sexta feira o tempo estava chuvoso, mas mesmo nessa condição conseguimos concluir todo o check list. Encontramos com o restante da tripulação no clube e no início da noite com o comandante. Nos apresentamos, jantamos, discutimos sobre as condições que enfrentaríamos e após um tempo de descontração nos recolhemos para encarar uma regata que poderia durar muito mais do que imaginávamos.
O sábado acordou com um belo dia de sol que tornou tudo mais empolgante, próximo às 09:30 hrs soltamos as cordas rumo a linha de largada. Nossa classe largaria às 10:00 hrs e tínhamos que pegar o alinhamento da bóia para definirmos como seria nossa largada.
Íamos largar com muitos barcos grandes como o nosso e isso exigia bastante de nossa tripulação.
Viemos de cano cheio para a linha e mesmo em meio ao grande volume de barcos, nosso comandante usou toda sua habilidade para encontrar um bom encaixe do barco em relação aos outros barcos da nossa classe.
Largamos em frente a sede do Iate Clube Veleiros da Ilha e seguimos rumo ao sul da ilha, conseguimos manter uma boa velocidade e como nosso proeiro conhecia bem a região, sua contribuição foi fundamental para nossas decisões, todas assertivas.
Tínhamos um barco de cruzeiro grande e decisões equivocadas nos traria problemas no resultado final.
Procurando aproveitar ao máximo os bons ventos, decidimos seguir com bordos longos, o que nos rendeu uma boa vantagem em relação aos outros barcos da nossa classe.
Quando avistamos a ponta dos naufragados tivemos que, em função de calado, executar algumas manobras. Ajustamos nosso rumo e contornamos a ponta dos naufragados sem maiores problemas.
Era um dia de mar calmo e apesar de todas as lendas que reza aquele lugar, nossa lembrança seria tranqüila se não fosse a mensagem passada pelo rádio. Minutos após contornarmos a ponta dos naufragados ouvimos um pedido de socorro, estávamos decidindo o uso do balão quando ouvimos pelo rádio, mayday mayday, na mesma hora ficamos atentos ao rádio para saber do que se tratava o chamado. Um dos nossos tripulantes disse: algum barco está indo à pique!
Foi quando num rápido movimento olhamos para a popa para ver se mais alguém havia cruzado aquele lugar e identificamos através de mais um chamado, mayday mayday, estamos em frente ao ilhote da ponta dos naufragados. O barco estava sem leme e com todas as velas içadas dançava num ballet desenfreado de um bordo para o outro rapidamente. Após alguns minutos o barco conseguiu se afastar das pedras por sorte, baixou todas as velas e recebeu o retorno do iate clube dizendo que uma lança de socorro já estava a caminho.
Seguimos nosso rumo, afinal estávamos competindo e deveríamos seguir uma vez que o socorro já havia sido anunciado.
O que não prevíamos é que minutos mais tarde seríamos surpreendidos, o vento rondou um pouco e nosso rumo nos permitiria o uso do balão novo.
O vento estava bom, mas um erro na manobra fez com que déssemos uma atravessada e ficássemos com meio barco dentro da água por alguns instantes. Para alguns menos experientes um susto, para outros um momento que deveria ser corrigido, pois naquela situação perdíamos minutos preciosos que poderíamos navegar a 10/12 knots.
Depois daqueles minutos de tensão, corrigimos a manobra e seguimos navegando.
Pouco menos de uma hora após esse episódio, assistimos um barco ter seu balão rasgado ao meio e passar um bom tempo tentando descer o pouco que restou e que estava preso à adriça, pelo nosso través tambem retornava um outro barco que teve problemas com a genoa. O vento era intenso e essas cenas poderiam acontecer à qualquer um de nós, experientes ou não.
Seguimos nossas navegada de maneira tranqüila, decidimos por uma navegada mais segura e assim cruzamos todas as praia em direção ao norte da ilha. Após cruzarmos a região onde encontra-se a ponta da Daniela e Ratones o vento reduziu muito, quase parou. Parece brincadeira, mas já não é a primeira vez que, após mais de 10 horas navegando numa regata fico a menos de uma milha praticamente parado.
Demos dezenas de bordos até finalmente alcançarmos a linha de chegada às 00:55 hrs, concluindo a prova em 13:20:41 como campeões da classe RGS Cruzeiro.

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