Bruno Fontes assume falhas na Olimpíada e diz não temer concorrência de Scheidt


"O apoio ao esporte pode ainda não ser ideal, mas nunca foi tão bom como hoje. A culpa foi toda minha. Faltou eu velejar melhor"

Por Antonio Alonso – Blog Sobre as Águas

Um dia depois de Robert Scheidt anunciar seu retorno à classe Laser, eu conversei com o catarinense Bruno Fontes, laserista brasileiro 13º colocado na Olimpíada deste ano. Fiquei feliz por encontrar um atleta determinado, que assumiu os erros e que está confiante no próprio talento. No meu balanço olímpico aqui neste blog, eu tentei me manifestar contra a postura de achar que os atletas não conseguem medalhas porque são coitadinhos abandonados. Não é mais assim. Muita coisa mudou no esporte brasileiro. A gente não está acostumado a dar confiança a quem elogia mas, mesmo com uma confederação no buraco, a Vela nunca teve tanto apoio. E não é diferente com vários outros esportes.

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Pode não dar Ibope falar bem de política governamental. Eu sei que ganharia muito mais amigos se mandasse um "isto é uma vergonha", mas não estou aqui para fazer amigos.

Voltemos ao Bruno. O catarinense reconhece que poderia ter ido melhor, e que seu ponto fraco foram as largadas. Quando ele largou bem, chegou na frente, quando largou mal, resolveu arriscar demais na tática e se deu mal. Parece que nem o retorno de Robert Scheidt o assusta. "Eu gosto de desafios e acho que ter ele na raia vai ser um super desafio, e vai até ajudar a pressão a sair de cima de mim um pouco", desabafa.

Leia abaixo como foi a entrevista:

Bruno, como você avalia seu 13º lugar na Olimpíada?

Sem dúvida, eu poderia ter ido melhor. Eu fiz uma excelente preparação, não mudaria nada do que fiz no meu ciclo olímpico, tive grandes resultados antes. Eu fui quinto colocado na regata Pré-olímpica, disputada na raia de Weymouth, ou seja, tinha chances reais de medalhas. O que aconteceu foi que tive uma semana infeliz. Logo na primeira regata, tive uma bandeira amarela, caí para 17º. Sem ela eu teria terminado bem. Nesse dia, fiz um 17º e um 2º.

Seu objetivo era a medalha...

Sim. Eu tive sempre na cabeça que quarto, quinto ou vigésimo, para mim era a mesma coisa. Eu queria era a medalha. Faltou eu ter largado melhor também e as coisas foram não acontecendo desde o começo. Como eu não largava bem, arrisquei mais do que o normal e nem sempre dava certo.

Em termos de estrutura e apoio, o que faltou pra você?

Não faltou nada, o problema foi na minha velejada. Nos últimos dois anos venho tendo apoio total do COB, que sabia que eu tinha chances reais de medalha. Nesses últimos dois anos tive técnico direto, coisa que eu nunca tinha tido, fiz praticamente todas as viagens que eu gostaria de ter feito. Eu tive todo o suporte do comitê olímpico, sou muito grato. Faltou mesmo eu velejar melhor.

Mas o que aconteceu então?

Um mês antes da Olimpíada nós fomos para a Inglaterra e eu me saí muito bem. O problema, para mim, foi que na Laser a flotilha é muito grande e as pernas eram muito curtas. Se você não larga bem, fica difícil, e eu não fui feliz nas largadas. Nas três regatas em que terminei na frente, larguei bem. Quando largava mal, eu era obrigado a arriscar mais.

E a parte psicológica?

Eu fui confiante e tranquilo, mas isso não vale nada se você não conseguir aplicar na regata. A culpa foi toda minha, nunca senti falta da parte psicológica. Faltou largar melhor.

E o futuro, agora com Scheidt?

Eu sigo firme até 2016. Tenho evoluído, pena que não fui melhor em Londres, eu gostava muito da raia, que era de vento forte. Os organizadores também fizeram muita troca de raia, colocaram a gente para velejar em raias onde não tínhamos competido ainda. Eu acho que a seletiva brasileira vai ser muito forte, mas estou bem motivado. Vem uma nova geração aí, com Mateus [Dellagnelo], [João] Hackerott e agora também o Scheidt. Mas eu gosto de desafios e acho que ter ele na raia vai ser um super desafio, e vai até ajudar a pressão a sair de cima de mim um pouco

Mas você acha justa a forma de seletiva, acha justo o apoio ir todo apenas para o primeiro do ranking nacional?

Isso foi uma coisa que atrapalhou bastante minha evolução. Durante minha formação, todo o apoio foi concentrado somente no Scheidt. Não sei como será dessa vez, mas acho que provavelmente vão mudar, porque o Brasil não precisa mais buscar vaga, todas as classes estão classificadas. Não acho ideal, mas é o que tem. Eu imagino que vai ter muita gente evoluindo e vamos chegar em 2016 com muita gente boa pra disputar a vaga e a Olimpíada.

É difícil ser velejador profissional no Brasil?

Quem fica fora de EUA, Europa e Oceania, está mais longe do intercâmbio. A campanha fica muito mais cara e aqui também falta renovação, de mais adversários de alto nível para um puxar o outro. Sou muito mais otimista hoje do que antes. Quem começa hoje no esporte tem muito mais apoio, com bolsa atleta, lei Agnelo Piva, até da confederação. Estou muito confiante e acredito que as coisas vão melhorar ainda mais. Confio no meu trabalho e seu que posso apresentar mais do que eu já apresentei até agora. Talento para isso eu tenho.

Muita gente considerou o desempenho do Brasil na Olimpíada um fracasso e culpou a falta de apoio.

O que acontece é que, devido exatamente a essa cobrança por medalha sobre o COB, na reta final recebe mais grana quem tem mais chance de medalha. O investimento não é igual em todas as classes, justamente devido ao resultado delas. Se não tem dinheiro pra todo mundo, quem tem mais chances ganha mais grana. Não é só falta de apoio. Dinheiro tinha, mas com certeza a Adriana [Kostiw, da Laser Radial], teve um apoio diferente do Scheidt. Mas acho isso normal, pelos resultados dela.

Para você então, o que faltou para a equipe?

Falta renovação na Vela brasileira. A culpa nem é do COB, mas sim dos clubes. Quando a renovação para, afeta o desempenho lá em cima. Muita gente boa hoje deixa de velejar para se dedicar à vida profissional de médico, advogado... O apoio não é o ideal, mas melhorou muito, é preciso saber reconhecer. Hoje eu consigo viver da Vela peloa poio do COB somado a meus patrocinadores. Nossa cultura é dar apoio pra quem chegou no topo, acho que 2016 as coisas vao melhorar.

E você concorda que a Vela brasileira foi mal em Londres?

Acho que a Vela manteve a média. Tivemos a medalha do Scheidt, as finais de Bimba e 470 feminino. Eu e a Patrícia [Freitas, da Prancha] poderíamos ter ido melhor. Mas se você pegar os países, fora a Austrália, vai ver que as medalhas foram muito mais diluídas, resultado da evolução do esporte pelo mundo. Tirando uns dois atletas, ninguém nessa Olimpíada chegou com o caminho fácil ao ouro. Estou confiante que ainda vamos ter grandes resultados pela frente.

Algum recado final?

Eu agradeço a todo mundo que me apoiou e que torceu por mim. Fiquei triste de não ter chegado lá. Sei da dificuldade da minha categoria, tenho muita lenha pra queimar e o atleta tem que estar preparado pra receber críticas, avaliar e continuar. Eu continuo confiante, gosto do que faço e tenho uma oportunidade boa de encerrrar minha carreira com chave de ouro no Brasil, coisa que nao fui competente para fazer em Londres. Eu tenho meu sonho, que é fazer melhor ainda e buscar essa medalha no Rio.